Seleção de 82. Brasil 2 X 3 Itália. Como o Brasil jogava? Como o futebol mudou? Por que perdemos?
Ganhar como em 94 ou perder como em 82. Incontáveis programas de televisão, revistas e jornais já fizeram essa pergunta. Para muitos foi o melhor time que já tivemos desde 1970 e foi em 82 que foi definido mundialmente que o futebol-força seria superior ao futebol-arte. Isso tudo está certo? Perdemos mesmo para um time que tinha apenas força?
A Itália tinha um ótimo goleiro, Zoff . Paolo Rossi jogou todo o talento que não gastou nos dois anos em que esteve suspenso justo naquele jogo. Gentile marcou espetacularmente Zico, Cabrini tinha um fôlego fantástico e marcava e apoiava muito bem. Muitos tomam Scirea como exemplo de líbero, posição bem fora de moda hoje. No gol o Brasil tinha Waldir Peres. Carlos, reserva, era mais regular. Apesar de ser claramente o melhor goleiro do Brasil a birra do Telê com Leão foi o bastante pra ele ficar por aqui mesmo. E já começamos na desvantagem.
Na defesa havia Leandro, um lateral direito ambidestro. Técnica fora do comum, extremamente habilidoso, com muito tempo de bola e posicionamento. Comparado à Domingos da Guia como zagueiro e Carlos Alberto Torres como lateral, ou seja, nas duas posições tido como um dos melhores ou o melhor que já houve no Brasil. Pode ver Leandro em ação no vídeo acima. Provavelmente o Brasil nunca teve um lateral tão habilidoso quanto ele. No restante da zaga, Oscar e Luizinho como zagueiros e Júnior como lateral esquerdo. Júnior era destro, algo raro, já que isso dificulta cruzamentos. Porém auxilia os chutes. Júnior depois se tornou um meia excelente. Mas a zaga italiana era superior e eles sabiam que laterais são defensores.
No meio, Cerezo, Falcão, Sócrates e Zico. Cerezo era um volante que ia e voltava, o box-to-box, que infelizmente por longo tempo não produzimos. Falcão era volante, de altíssima qualidade e habilidade, mas jogou com o grupo praticamente só na copa. Antes era Paulo Isidoro quem estava na seleção no seu lugar. Em parte isso ocorreu porque os times europeus não eram obrigados a liberar os jogadores para amistosos da seleção. Sócrates era meia-atacante, mas já foi artilheiro do campeonato paulista e fazia muitos gols. Bem conhecido pelos seus passes e gols de calcanhar. Em uma entrevista disse que desenvolveu isso porque era muito grande e pesado e demorava muito para girar. Zico era ponta de lança e claramente o craque do time. Provavelmente dispensa comentários.
Bota ponta telê! Com esse bordão o Zé da galera, personagem do Jô soares, pedia que o time jogasse no padrão da década, o 4-3-3. Mas a seleção estava mudando para o 4-4-2, que tinha um ponta apenas. Éder era um ponta esquerda em um esquema sem ponta direita. Pouco tempo depois esse ponta único foi chamado de segundo atacante. Como no ataque Sócrates, Falcão e Zico caíam muito pela direita não houve desequilíbrio ofensivo. Porém, Éder voltava para marcar (o atual recompor), enquanto os três do lado direito não tinham muito esse hábito, o que deixava Leandro sobrecarregado. Paulo Isidoro nesse ponto fez falta. O Brasil tomou gol em todos os jogos da Copa, exceto no 4 a 0 contra a Nova Zelândia. Os que voltavam para marcar eram conhecidos como falsos-pontas, como Éder.
Um dos azares dessa seleção foi o centroavante. Careca e Reinaldo se lesionaram. Careca foi o melhor centroavante que o Brasil teve no período entre Tostão e Romário. Reinaldo porém foi uma certa versão anos 70 do Ronaldo Fenômeno, com muitas lesões que o impediram de jogar (perdeu duas Copas por isso) e depois de manter o alto nível. Milton Neves disse que se não fossem as lesões poderia ter sido do mesmo nível que Pelé. Serginho Chulapa, centroavante brigador que fazia muitos gols mesmo sem grande técnica, foi para a Copa, com Roberto Dinamite na reserva. Com mais habilidade e gols na carreira que Chulapa não necessariamente seria um titular melhor. Mas não foi tão determinante.
Já foi dito que se Falcão fosse trocado por Paulo Isidoro ganharíamos esse jogo. Leandro assim não ficaria sozinho na defesa pela direita. Porém, a troca por Falcão é completamente natural. Uma mudança diferente poderia colocar Serginho na reserva, como a seleção ficou no final do jogo. O ataque também ficaria mais fluido, o que permitiria fugir melhor da marcação individual italiana. Sócrates poderia jogar como atacante, o que fez em muitas ocasiões em sua carreira. A seleção jogava muito pelo meio de campo. A troca permitiria mais jogadas pelas pontas. Os meias caíam pela direita, mas não era o "habitat natural" deles. E Éder não ficou tão aberto como de costumava nesse jogo. Além de melhor marcação com a entrada de Paulo Isidoro e sapuda de Chulapa.
Dizer que a seleção buscava o ataque o tempo todo é meia verdade. No terceiro gol todos estavam defendendo. Houve certo relaxamento e se esperar o tetra era natural, porque ganhou muito bem da Argentina de Maradona na rodada anterior, que era a atual campeã. Uma outra questão é que o jogo italiano era "torto". O lateral esquerdo avançava muito mais do que o direito, então Leandro tinha que marcar muito mais do que Júnior, mesmo já sobrecarregado taticamente. Batista foi sugerido depois como alguém que faria aquele time defender melhor, mas como tirar Cerezo e Falcão? Batista estava machucado no dia do jogo então sua entrada seria impossível.
Enfim, por que perdemos? Azares de um jogão histórico. A Itália tinha uma seleção excelente. Paolo Rossi seria o melhor do mundo se houvesse a eleição na época. Scirea seria titular em qualquer seleção do mundo. Gentili,Cabrini e Tardelli eram excelentes, além de Dino Zoff ser muito superior a Waldir Peres. Zico no final do primeiro tempo teve sua camisa rasgada dentro da área e não foi marcado o pênalti. Se tivéssemos VAR.... Também teimosia do Telê e um Paolo Rossi inspirado. O time favorito ganha apenas em 48% dos casos, sendo os outros empate ou derrota. Se vissem o pênalti no Zico, se Leão estivesse jogando, se Paolo Rossi não tivesse completamente inspirado... Porém, as vezes simplesmente tudo se encaixa. E já aconteceu a favor do Brasil também. Por exemplo, Brasil 2 x 1 Inglaterra na Copa de 2002 e Brasil x Espanha, copa de 62.
E o que mudou de 1982 até hoje? Não se usa mais líberos. O jogo à italiana não existe mais e não se produz mais times tortos, pelo menos não naquele nível. O 4-4-2 à brasileiras, também conhecido como 4-2-2-2 foi o esquema principal do Brasil na década de 90 e meio da década de 2000. O jogo também ficou mais veloz. No caso brasileiro, também houve uma certa perda de inocência. Não se acreditam mais que é só colocar os jogadores em campo sem preocupações que ganharemos fácil. A preocupação com a tática ficou muito mais forte após essa Copa. E graças a esse jogo Zico não foi reconhecido como deveria. Jogou em nível muito mais alto que Maradona e Platini, mas não ganhou nada com a seleção. Telê também teve a fama de pé frio, mas conseguiu depois se reerguer no São Paulo bicampeão do mundo.
A Itália tinha um ótimo goleiro, Zoff . Paolo Rossi jogou todo o talento que não gastou nos dois anos em que esteve suspenso justo naquele jogo. Gentile marcou espetacularmente Zico, Cabrini tinha um fôlego fantástico e marcava e apoiava muito bem. Muitos tomam Scirea como exemplo de líbero, posição bem fora de moda hoje. No gol o Brasil tinha Waldir Peres. Carlos, reserva, era mais regular. Apesar de ser claramente o melhor goleiro do Brasil a birra do Telê com Leão foi o bastante pra ele ficar por aqui mesmo. E já começamos na desvantagem.
Na defesa havia Leandro, um lateral direito ambidestro. Técnica fora do comum, extremamente habilidoso, com muito tempo de bola e posicionamento. Comparado à Domingos da Guia como zagueiro e Carlos Alberto Torres como lateral, ou seja, nas duas posições tido como um dos melhores ou o melhor que já houve no Brasil. Pode ver Leandro em ação no vídeo acima. Provavelmente o Brasil nunca teve um lateral tão habilidoso quanto ele. No restante da zaga, Oscar e Luizinho como zagueiros e Júnior como lateral esquerdo. Júnior era destro, algo raro, já que isso dificulta cruzamentos. Porém auxilia os chutes. Júnior depois se tornou um meia excelente. Mas a zaga italiana era superior e eles sabiam que laterais são defensores.
No meio, Cerezo, Falcão, Sócrates e Zico. Cerezo era um volante que ia e voltava, o box-to-box, que infelizmente por longo tempo não produzimos. Falcão era volante, de altíssima qualidade e habilidade, mas jogou com o grupo praticamente só na copa. Antes era Paulo Isidoro quem estava na seleção no seu lugar. Em parte isso ocorreu porque os times europeus não eram obrigados a liberar os jogadores para amistosos da seleção. Sócrates era meia-atacante, mas já foi artilheiro do campeonato paulista e fazia muitos gols. Bem conhecido pelos seus passes e gols de calcanhar. Em uma entrevista disse que desenvolveu isso porque era muito grande e pesado e demorava muito para girar. Zico era ponta de lança e claramente o craque do time. Provavelmente dispensa comentários.
Bota ponta telê! Com esse bordão o Zé da galera, personagem do Jô soares, pedia que o time jogasse no padrão da década, o 4-3-3. Mas a seleção estava mudando para o 4-4-2, que tinha um ponta apenas. Éder era um ponta esquerda em um esquema sem ponta direita. Pouco tempo depois esse ponta único foi chamado de segundo atacante. Como no ataque Sócrates, Falcão e Zico caíam muito pela direita não houve desequilíbrio ofensivo. Porém, Éder voltava para marcar (o atual recompor), enquanto os três do lado direito não tinham muito esse hábito, o que deixava Leandro sobrecarregado. Paulo Isidoro nesse ponto fez falta. O Brasil tomou gol em todos os jogos da Copa, exceto no 4 a 0 contra a Nova Zelândia. Os que voltavam para marcar eram conhecidos como falsos-pontas, como Éder.
Um dos azares dessa seleção foi o centroavante. Careca e Reinaldo se lesionaram. Careca foi o melhor centroavante que o Brasil teve no período entre Tostão e Romário. Reinaldo porém foi uma certa versão anos 70 do Ronaldo Fenômeno, com muitas lesões que o impediram de jogar (perdeu duas Copas por isso) e depois de manter o alto nível. Milton Neves disse que se não fossem as lesões poderia ter sido do mesmo nível que Pelé. Serginho Chulapa, centroavante brigador que fazia muitos gols mesmo sem grande técnica, foi para a Copa, com Roberto Dinamite na reserva. Com mais habilidade e gols na carreira que Chulapa não necessariamente seria um titular melhor. Mas não foi tão determinante.
4-4-2 do Brasil. por André Rocha |
Já foi dito que se Falcão fosse trocado por Paulo Isidoro ganharíamos esse jogo. Leandro assim não ficaria sozinho na defesa pela direita. Porém, a troca por Falcão é completamente natural. Uma mudança diferente poderia colocar Serginho na reserva, como a seleção ficou no final do jogo. O ataque também ficaria mais fluido, o que permitiria fugir melhor da marcação individual italiana. Sócrates poderia jogar como atacante, o que fez em muitas ocasiões em sua carreira. A seleção jogava muito pelo meio de campo. A troca permitiria mais jogadas pelas pontas. Os meias caíam pela direita, mas não era o "habitat natural" deles. E Éder não ficou tão aberto como de costumava nesse jogo. Além de melhor marcação com a entrada de Paulo Isidoro e sapuda de Chulapa.
Dizer que a seleção buscava o ataque o tempo todo é meia verdade. No terceiro gol todos estavam defendendo. Houve certo relaxamento e se esperar o tetra era natural, porque ganhou muito bem da Argentina de Maradona na rodada anterior, que era a atual campeã. Uma outra questão é que o jogo italiano era "torto". O lateral esquerdo avançava muito mais do que o direito, então Leandro tinha que marcar muito mais do que Júnior, mesmo já sobrecarregado taticamente. Batista foi sugerido depois como alguém que faria aquele time defender melhor, mas como tirar Cerezo e Falcão? Batista estava machucado no dia do jogo então sua entrada seria impossível.
Esquema italiano" jogo à italiana". Imagem de Clic RBS |
Enfim, por que perdemos? Azares de um jogão histórico. A Itália tinha uma seleção excelente. Paolo Rossi seria o melhor do mundo se houvesse a eleição na época. Scirea seria titular em qualquer seleção do mundo. Gentili,Cabrini e Tardelli eram excelentes, além de Dino Zoff ser muito superior a Waldir Peres. Zico no final do primeiro tempo teve sua camisa rasgada dentro da área e não foi marcado o pênalti. Se tivéssemos VAR.... Também teimosia do Telê e um Paolo Rossi inspirado. O time favorito ganha apenas em 48% dos casos, sendo os outros empate ou derrota. Se vissem o pênalti no Zico, se Leão estivesse jogando, se Paolo Rossi não tivesse completamente inspirado... Porém, as vezes simplesmente tudo se encaixa. E já aconteceu a favor do Brasil também. Por exemplo, Brasil 2 x 1 Inglaterra na Copa de 2002 e Brasil x Espanha, copa de 62.
E o que mudou de 1982 até hoje? Não se usa mais líberos. O jogo à italiana não existe mais e não se produz mais times tortos, pelo menos não naquele nível. O 4-4-2 à brasileiras, também conhecido como 4-2-2-2 foi o esquema principal do Brasil na década de 90 e meio da década de 2000. O jogo também ficou mais veloz. No caso brasileiro, também houve uma certa perda de inocência. Não se acreditam mais que é só colocar os jogadores em campo sem preocupações que ganharemos fácil. A preocupação com a tática ficou muito mais forte após essa Copa. E graças a esse jogo Zico não foi reconhecido como deveria. Jogou em nível muito mais alto que Maradona e Platini, mas não ganhou nada com a seleção. Telê também teve a fama de pé frio, mas conseguiu depois se reerguer no São Paulo bicampeão do mundo.
Melhores momentos do jogo
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